terça-feira, 26 de maio de 2009

O amor








Se, contudo, amardes e precisardes ter desejos,
Sejam estes os vossos desejos:
De vos diluirdes no amor e serdes como um riacho
Que canta sua melodia para a noite;
De conhecerdes a dor de sentir ternura demasiada;
De ficardes feridos por vossa própria compreensão do amor
E de sangrardes de boa vontade e com alegria;
De acordardes na aurora com o coração alado
E agradecerdes por um novo dia de amor;
De descansardes ao meio-dia
E meditardes sobre o êxtase do amor;
De voltardes para casa à noite com gratidão;
E de adormecerdes com uma prece no coração para o bem-amado,
E nos lábios uma canção de bem-aventurança.

Gibran Kahlil Gibran

Jacqueline nascera sob o signo da independência e da alegria. Vivia só, cuidava bem de sua vida. Morava em um cômodo pequeno e arrumado na periferia da cidade. Separara-se da família, muito religiosa e vivendo numa seriedade e tristeza sem par. Não. Ela nascera alegre. Gostava de andar, de acompanhar a sua sombra, para certificar-se que era real. Brincava muito. Apreciava dar o que deu para dar-se a natureza. Enchia de prazer e dança a sua vida. Amava o canto dos pássaros. Devaneava. Seus orgasmos múltiplos eram um vendaval que a agitava para depois, aos poucos, voltar à paz, apaziguado o coração. Esta a sua ambição. Tinha, sim, seus momentos de melancolia, pelos quais passava sozinha. Guardava-os numa caixinha de jóias. Não queria homem para lhe dar suporte. Solitária. Gostava deles, porém muito mais da sua própria independência. Quanto mais admirava o seu parceiro eventual, mais ela se recolhia dentro de si. Tornava-se misteriosa e prendia a curiosidade e o coração do companheiro. Era aventureira do amor. Não admitia rodeio em seus desejos. Conheceu outro dia, um rapaz, permitiu que ele a acompanhasse até sua casa e ali mesmo se despediu. Talvez fosse tímido e precisasse de incentivo. Mandou sua foto deitada nua, fazendo um convite expresso, sem palavras.

Viveram intensamente muitos momentos. Ele também – percebera - se ajustava inteiro em sua sombra.

Um homem decidido, moreno, atarracado, de cabelos encaracolados, pele muito branca, olhos castanhos ensolarados, alguém poderia chamá-lo de italiano, os gestos intempestivos eram desmentidos pela delicadeza das palavras. Possuía um dom natural para escolher palavras, falava várias línguas, recebera uma boa quantidade de dinheiro do seu pai e fora aconselhado a sair, viajar para conhecer o mundo, ter mais experiência e poder, um dia, mais tarde, tocar os negócios da família. Apaixonou-se por ela. Não queria outra coisa senão estar com ela. Depois de aceitar o convite da foto, ela o atendeu nos pedidos mais extravagantes. Tudo era prazer, delícia, entrega e proximidade até o ponto de fusão. Entretanto, jamais moravam juntos, precisava de distância. O ciúme o corroia, passou a persegui-la, sorrateiro, em sua rotina, chegou a vê-la com outros parceiros, velhos, novos, dois ou três, ao sabor dos ventos, como ela dizia. Não conseguia encontrar a maneira de prendê-la. Foi embora por algum tempo, por não encontrar nenhuma solução viável, e para atender ao chamado do pai.
Na viagem, leu no jornal: “Pai assassina filha com tiro à queima-roupa”. O religioso (nome, idade) invadiu estabelecimento comercial onde trabalhava a filha (nome, idade) e depois de uma breve discussão, acusando-a de prostituição e de envergonhar o bom nome da família, sacou da cintura o revólver com o qual a fulminou ali mesmo.

Deixou de ler as demais informações. Estava estarrecido. Não conseguia compreender o que havia acontecido.

Encontrou seu pai. Ouviu dele um sermão daqueles, que o dinheiro que ele confiara fora desperdiçado, da forma mais vil, com pessoas de má índole. Mulheres, passeios, jogos, bebidas. Como era possível uma explicação? O que ele pensava da vida? Isso tudo leva a quê? “Eu quero que você se prepare para a vida, construa o seu futuro. Meu pai não me deu isso”.

O filho bem que tentava ouvir, não conseguia tirar Jackie da cabeça. Quanto mais pensava nela, mais se excitava e não conseguia compreender o rugido do pai. Estava excitado, lembrava da expressão angelical, da boca carnuda, do corpo pequeno, proporcional, da carne rija, dos seios empinados, sôfrego a ponto de tirar o pênis para fora e, antes que o estupor do pai se transformasse em ato, atacou rijo e se masturbou rápida, doce e languidamente. Com a mão servindo de concha, aparou e entregou o resultado ao pai.

“Aqui. Não lhe devo mais nada. Estamos quites.”